Lorelai

Música: "Vermilion, Pt. 2", Slipknot

Descobri um grande problema – senão o meu maior problema ou mesmo o de toda a humanidade. Gostamos de alguém, amamos essa pessoa acima de qualquer outra. E depois ela magoa-nos, faz-nos sentir um mar de gelo, uma lança de fogo. Entristece-nos.

Nessa altura, que é que se faz…?

Não há ninguém para apanhar as peças e arranjá-las de novo. Não há o sorriso reconfortante, o abraço apertado, o beijo carinhoso. Não há ninguém. Não tens quem te pegue ao colo, quem te dê a mão e te faça ser forte de novo.

E sentes-te pequenina. E só queres ter isso outra vez – ainda que te questiones se alguma vez o tiveste de facto. Mas no fundo sabes que sim. É um bem perdido. Ele é o Jardim de Éden, tudo o que precisas, a única coisa que precisas. Tudo o que pensas todo o dia, aquele sorriso, o perfume dele. E embora não o sintas há tanto tempo, continua sempre à tua volta, naquele momento é como se ele próprio estivesse ali.

Mas não está. Então entras em repeat mode, sonhas que o real é ilusão e que a ilusão é real. E acreditas nisso com todas as tuas forças porque não há mais nada a fazer. Não sabes o que fazer quando ele te deixa triste.

Mesmo que nada mais reste: ele não está contigo.
Lorelai

Música: "Away From The Sun", 3 Doors Down

Os últimos raios intensos do pôr-do-sol incomodam-me os olhos. Observando o horizonte, aqui sentada, tudo me parece dolorosamente pacífico. Uma paz estranha e há muito esquecida e não sentida inunda-me o coração vazio. Tudo é vazio. Incerto. Misterioso. Incompreensível. Doloroso.
Brinco com a areia nos meus dedos perdidos, à deriva como aquele velho barco; aquele barco sem capitão, feito já apenas de memórias, ansiando embater contra as severas rochas, para tudo acabar de vez.
O Sol vai-se pondo, a minha vista vai acalmando. Como tudo, volta à normalidade. Assim como eu voltarei à normalidade, apesar da âncora que, sinto-o ainda, tu lançaste no meu peito; âncora essa que, pouco a pouco, com muito e muito sofrimento, se vai içar, transformando-se então numa vela que me permita navegar, mais segura, para longe de mares turbulentos e incertos, como tu.
Com o céu azul me envolvendo, o calor fazendo-se sentir no meu rosto, apercebo-me de toda a imensidão que me rodeia. O mundo que eu ignorei, por ti. A vida que a tua presença, a tua lembrança me não deixou viver. A imensidão que eu, sozinha como sempre foi e, arrisco-me a dizer e a sentir, sempre será, tenho pavor de enfrentar. A grandeza de tudo aterroriza-me e, sem ti, ou apenas sem a ilusão que eras tu, torna-se ainda mais difícil enfrentá-la. O vazio preenche-me; preenche-me em redor, nesta praia agora deserta, e preenche-me o interior. Este vazio por ti deixado, ainda não sei como preenchê-lo; mas, tal como tu conseguiste, hei-de encontrar algo que me realize, que me faça feliz. Feliz, mas feliz de facto; feliz como tu nunca me fizeste realmente.
Custa enfrentar tudo isto, como custa aos meus olhos contemplar o Sol. Sem protecção, desamparada, sozinha custa enfrentar o que magoa. Mas quando não há outro modo, temos de saltar os obstáculos e continuar a viver. E, apesar de os murmúrios e sussurros do mar me recordarem um nome, agora apenas uma recordação rasgada pelo destino, sinto-me calma, como o oceano diante de mim. Não mais os turbilhões de emoções, as dúvidas que corroem, as ilusões sem sentimento. Apenas… nada. O nada que me envolve, o nada que me preenche. O nada que é noite, com a Lua alta no céu, agora, ali… E o tudo que é dia, com o Sol brilhante, como será amanhã, ao amanhecer. Como em tudo o mais, há sempre uma segunda hipótese, uma esperança, algo pelo qual viver.
Mas com pesar me vejo na escuridão; não pelo Sol-posto, não pelo anoitecer. Antes na penumbra das réstias de ilusão que ainda raspam o meu exausto coração. Ilusão que me cegou, me matou; ilusão que me magoa, vendo-a tal como ela é: ilusão cruel e castradora. E para voar saio desta ilusão, voo para lá desta praia distante tão desejada, e tão ingenuamente imaginada.
Lorelai

Música: "Follow Through", Gavin DeGraw

E acaba por não ser uma inversão tão absoluta de todo este processo. Talvez até seja o fim deste capítulo. Não porque quero, mas porque preciso. Já não é possível alimentar mais um sonho que nunca chegará em tempo algum.

Não procuro enganar-me mais. Já por muitas vezes disse que te esqueci, nunca conseguido que isso se mantivesse verdade por muito tempo. Portanto, não arrisco fazer prognósticos antes do jogo. Deixa a bola correr; como disse alguém, estou só a "jogar com um pé, não sei o que se passa com o outro"...

Não arrisco dizer que não voltarei a pensar em ti. Se não o fizesse, não estava neste momento a escrever-te, sem ser para ti. A verdade é que é um hábito, falar-te sem sequer te falar. Talvez seja essa a parte mais complicada do processo.

Sim, era ilusão. Mas só nos apercebemos de um bem perdido - mesmo que um bem ilusório - quando já ele se escapou das nossas mãos, quando já não tem retorno possível. Contudo, é também nesse momento que se torna mais clara a essência desse bem. Neste caso, a ilusão. Foste uma ilusão, és e possivelmente sempre o serás. E que bela ilusão.

Não me atrevo a dizer que te esqueci. Talvez porque não me parece que alguma vez te esqueça de facto. Não te esqueci. Mas chegou a altura de te deixar ir.