Lorelai

Música: "Away From The Sun", 3 Doors Down

Os últimos raios intensos do pôr-do-sol incomodam-me os olhos. Observando o horizonte, aqui sentada, tudo me parece dolorosamente pacífico. Uma paz estranha e há muito esquecida e não sentida inunda-me o coração vazio. Tudo é vazio. Incerto. Misterioso. Incompreensível. Doloroso.
Brinco com a areia nos meus dedos perdidos, à deriva como aquele velho barco; aquele barco sem capitão, feito já apenas de memórias, ansiando embater contra as severas rochas, para tudo acabar de vez.
O Sol vai-se pondo, a minha vista vai acalmando. Como tudo, volta à normalidade. Assim como eu voltarei à normalidade, apesar da âncora que, sinto-o ainda, tu lançaste no meu peito; âncora essa que, pouco a pouco, com muito e muito sofrimento, se vai içar, transformando-se então numa vela que me permita navegar, mais segura, para longe de mares turbulentos e incertos, como tu.
Com o céu azul me envolvendo, o calor fazendo-se sentir no meu rosto, apercebo-me de toda a imensidão que me rodeia. O mundo que eu ignorei, por ti. A vida que a tua presença, a tua lembrança me não deixou viver. A imensidão que eu, sozinha como sempre foi e, arrisco-me a dizer e a sentir, sempre será, tenho pavor de enfrentar. A grandeza de tudo aterroriza-me e, sem ti, ou apenas sem a ilusão que eras tu, torna-se ainda mais difícil enfrentá-la. O vazio preenche-me; preenche-me em redor, nesta praia agora deserta, e preenche-me o interior. Este vazio por ti deixado, ainda não sei como preenchê-lo; mas, tal como tu conseguiste, hei-de encontrar algo que me realize, que me faça feliz. Feliz, mas feliz de facto; feliz como tu nunca me fizeste realmente.
Custa enfrentar tudo isto, como custa aos meus olhos contemplar o Sol. Sem protecção, desamparada, sozinha custa enfrentar o que magoa. Mas quando não há outro modo, temos de saltar os obstáculos e continuar a viver. E, apesar de os murmúrios e sussurros do mar me recordarem um nome, agora apenas uma recordação rasgada pelo destino, sinto-me calma, como o oceano diante de mim. Não mais os turbilhões de emoções, as dúvidas que corroem, as ilusões sem sentimento. Apenas… nada. O nada que me envolve, o nada que me preenche. O nada que é noite, com a Lua alta no céu, agora, ali… E o tudo que é dia, com o Sol brilhante, como será amanhã, ao amanhecer. Como em tudo o mais, há sempre uma segunda hipótese, uma esperança, algo pelo qual viver.
Mas com pesar me vejo na escuridão; não pelo Sol-posto, não pelo anoitecer. Antes na penumbra das réstias de ilusão que ainda raspam o meu exausto coração. Ilusão que me cegou, me matou; ilusão que me magoa, vendo-a tal como ela é: ilusão cruel e castradora. E para voar saio desta ilusão, voo para lá desta praia distante tão desejada, e tão ingenuamente imaginada.